por Francisco Russo
para ADORO CINEMA
Se você espera uma adaptação fiel ao clássico livro escrito por Mary Shelley, esqueça! Victor Frankenstein é uma livre recriação do universo imaginado pela autora, com direito a muitas intervenções – algumas interessantes, outras bem questionáveis.
A principal delas é o posto de protagonista dado ao corcunda Ígor, que sequer existe no livro – algo que chega a ser até curioso, visto que o título do filme supostamente coloca o holofote em seu parceiro de cena. Visto pela primeira vez no clássico Frankenstein, de 1931, o personagem não apenas ganha importância como uma história própria, consistente com o cenário proposto. Mérito (momentâneo) para o roteirista Max Landis, pela habilidosa introdução do personagem, que passa ainda pela construção da amizade e fascínio existentes entre o corcunda e seu “criador”, Victor Frankenstein. Entre aspas porque, por mais que o longa-metragem insista na transferência do conceito de criador/criatura para Ígor, a relação entre eles é mais fruto das diferenças sociais que possuem. Ainda assim, esta relação ambígua de dívida entre ambos norteia boa parte do longa-metragem.
Assistindo ao filme, é fácil compreender o porquê de Daniel Radcliffe ter se interessado pelo personagem do corcunda. Buscando papéis bem diferentes desde que deixou a série Harry Potter, o fato de estar mais uma vez em um ambiente sombrio – assim como em A Mulher de Preto e Amaldiçoado – e o desafio físico exigido pelo papel em seus primeiros 20 minutos são bastante interessantes. A bem da verdade, é a partir do momento em que Daniel deixa de ser corcunda que o filme, aos poucos, caminha ladeira abaixo. Não por culpa do ator ou de seu personagem, mas pelos rumos que a história toma – culpa do mesmo Max Landis, que tenta a todo instante inserir uma reviravolta de forma a dar uma suposta agilidade à narrativa ou simplesmente torná-la mais acessível ao público jovem.
Tal iniciativa, aliada à ânsia de trazer luz sobre a obsessão vivida pelo personagem-título, faz com que Victor Frankenstein torne-se uma colcha de subtramas mal fundamentadas e desenvolvidas. Do pífio interesse amoroso à perseguição policial com direito a questionamentos religiosos (!!!), o longa passa ainda por questões de família repentinamente tiradas da cartola e conflitos morais bem controversos. Tudo para que os dois personagens principais tenham sempre suas motivações justificadas, um mal que assola o atual cinema hollywoodiano, onde nenhuma pergunta pode ficar sem resposta – mesmo aquelas que não necessitam de qualquer explicação.
Em meio a tanto blá blá blá desnecessário, sobra pouco espaço para realmente desenvolver questões morais e éticas decorrentes da criação de vida artificial, após a morte. E, mesmo quando assume esta função, o longa oferece argumentos bastante contraditórios, no sentido de ora defender o livre pensar e logo em seguida questionar determinado uso por questões afetivas. É como se Victor Frankenstein, o filme, bailasse em suas crenças básicas de acordo com o que pregam as próprias reviravoltas do roteiro.
Mesmo com um roteiro tão problemático, ainda assim Victor Frankenstein oferece alguns pontos positivos. O principal deles é o elenco, especialmente Daniel Radcliffe, pelas já citadas exigências de seu papel. James McAvoy explora o lado obsessivo do personagem-título e, se não brilha, também não compromete - o contrário do policial interpretado por Andrew Scott, irritantemente mal construído e repleto de frases feitas. A ambientação, obviamente soturna e com uma pitada de gore, funciona a contento dentro do universo retratado. Pena que a iniciativa tão bem resolvida de início, em relação ao surgimento de Igor, acabe de perdendo por completo em meio às tentativas de criar estilo e dinâmica a partir de um material que, por si só, já tem muito a oferecer ao espectador.
VICTOR FRANKENSTEIN
(Victor Frankenstein, 2015, 109 minutos)
Direção
Paul McGuigan
Roteiro
Max Landis
Elenco
James McAvoy
Daniel Radcliffe
Jessica Brown Findlay
Bronson Webb
Daniel Mays
Spencer Wilding
Andrew Scott
Callum Turner
em cartaz nas Redes Roxy, Cinemar e CineSpaço
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