Friday, October 16, 2015

PETER BOGDANOVICH VOLTA À VELHA FORMA NA COMÉDIA 'UM AMOR A CADA ESQUINA"

por Chico Marques


Hollywood é um lugar muito estranho.

Vive atraindo para seu meio realizadores extremamente criativos da cena do cinema independente, e então, quando chega a hora deles mostrarem a que vieram, são podados impiedosamente em sua criatividade, e acabam produzindo filmes muito aquém de seus potenciais.

Tem sido assim desde sempre

Robert Altman teve experiências terríveis nesse sentido. Nunca foi perdoado por editar seu "Nashville" com três horas de duração e fazer uma apresentação secreta para a crítica do Village Voice Pauline Kael antes mesmo de mostrar o filme para os Caciques do Estúdio que o bancou -- e que tomaram conhecimento do filme já editado quando a crítica de Kael, saudando o filme como uma obra-prima, foi publicada. Altman foi vergonhosamente escanteado depois do fracasso retumbante de seu filme "H.E.A.L.T.H." (1980), e teve que passar boa parte dos Anos 80 e 90 fazendo cinema em Paris e teatro em Nova York.



Algo semelhante aconteceu também com Peter Bogdanovich.

Crítico muito respeitado, Bogdanovich estreou como diretor num filme independente produzido por Roger Corman chamado 'Targets", com Boris Karloff. Foi para Hollywood e, depois de uma série impecável de filmes de grande sucesso, como o drama árido "A Última Sessão de Cinema", a deliciosa comédia de erros "Essa Pequena É Uma Parada" e a comédia dramática "Lua de Papel", começou a colecionar um fracasso após o outro -- até ser crucificado em praça pública por realizar uma comédia romântica com poucos diálogos e muitos sorrisos e abraços em 1979, chamada "They All Laughed", com Ben Gazzara, Audrey Hepburn e sua mulher, a ex-coelhinha Dorothy Stratten. Juntos, eles circulavam pelas ruas de Nova York sem um objetivo específico ou uma trama específica, apenas vivendo apaixonadamente.

Hollywood descartou Bogdanovich em grande estilo, e ele seguiu de volta para o cinema independente, de onde saiu, emplacando nos anos seguintes alguns eventuais filmes de sucesso, como "Mask - Máscaras do Destino". Mas sua carreira perdeu a constância e então, nesses últimos 14 anos, ele não filmou mais. Passou a viver de palestras e é responsável por um blog sensacional sobre cinema ancorado no portal Indiewire, chamado Blogdanovich.

E então, aos 76 anos de idade, para surpresa geral, eis que Peter Bogdanovich está de volta à frente de uma comédia romântica deliciosa, com grandes estrelas no elenco -- Owen Wilson, Jennifer Aniston -- e um roteiro delicioso, que parece "Essa Pequena É Uma Parada" contado num tom woodyallenesco.



Tudo se passa em Nova York. Arnold Albertson (Owen Wilson) é um diretor de teatro que está selecionando o elenco para sua nova peça e costuma sair com garotas de programa que contrata por meio de uma agência na Internet. 

Mas algo sai errado e ele acaba se apaixonando por uma delas (Imogen Poots), e tenta convencê-la a deixar a prostituição propondo sustentá-la financeiramente. Ela não aceita. E então, alguns dias mais tarde, numa seleção de elenco, eis que ela aparece se candidatando ao papel justamente de uma prostituta apaixonada. 

No teste, ela contracena com Delta (Kathryn Hahn), mulher do diretor, que logo se encanta com o talento da moça e insiste para que seu marido dê a ela o papel. E ele, óbvio, não quer.


Para piorar, tem ainda um juiz (Austin Pendleton), que é um ex-cliente apaixonado por Isa, que, por sua vez, contrata um detetive (George Morfogen) para segui-la. 

E tem também Jane (Jennifer Aniston), uma psicanalista desequilibrada que cobre as férias da mãe, atendendo Isa e o juiz, e que é namorada de Josh (Will Forte), filho do detetive e autor da peça teatral, que também se apaixona pela garota de programa. 

Sem saída, o diretor acaba contratando Isa para o papel, o que também deixa feliz Seth Gilbert (Rhys Ifans), ator inglês excêntrico e protagonista do espetáculo. 

Em meio a essa confusão deliciosa, o diretor entra em desespero completo, pois está apaixonado pela garota e não quer que sua mulher descubra.



O roteiro do filme é assinado por Bogdanovich e por sua mulher Louise Stratten – curiosamente, a irmã de Dorothy Stratten, ex-coelhinha da Playboy e ex-namorada de Bogdanovich que foi brutalmente assassinada no início dos anos 80 por um ex-namorado exageradamente ciumento. 

Quem viu o filme "Star 80", de Robert Fosse, conhece bem essa história.



"Um Amor A Cada Esquina" é uma comédia deliciosa, com diálogos rápidos, inspirada nas “screwball comedies” que faziam tanto sucesso nos anos 30 e 40. 

Todos os atores estão perfeitamente escalados, e rendendo maravilhas, aparentemente muito felizes por estarem num projeto autoral de Peter Bogdanovich.



Uma curiosidade sobre a produção do filme: "Squirrels to the Nuts‘ foi o título original do filme, que mudou de nome por motivos comerciais, já que, segundo o diretor, o público americano poderia confundi-lo com um filme infantil.

Outra curiosidade: John Ritter estava escalado para ser o protagonista, mas faleceu pouco após a conclusão do roteiro, e Brie Larson interpretaria a prostituta, mas desistiu do papel.

Ah, não esqueçam de procurar por Quentin Tarantino e Michael Shannon perdidos no meio do elenco. Os dois, pelo visto, assim como todo o elenco do filme, são admiradores incondicionais do cinema de Peter Bogdanovich.



UM AMOR A CADA ESQUINA
(She's Funny That Way, 2015, 93 minutos)

Direção
Peter Bogdanovich

Roteiro
Peter Bogdanovich
Louise Stratten

Elenco
Owen Wilson
Jennifer Aniston
Imogen Poots
Will Forte
Kathryn Hahn
Rhys Ifans
George Morfogen

em cartaz no Roxy Iporanga 4 e no Cinespaço Miramar Shopping




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