Tuesday, May 17, 2016

2 OPINIÕES SIMPÁTICAS A "O CONTO DOS CONTOS", BELO FILME DE MATTEO GARRONE


“O CONTO DOS CONTOS”: UMA EXPERIÊNCIA VISUAL ÚNICA

por Carlos Cirne
para Colunas & Notas

Os contos de fadas, em suas configurações originais, não tinham versões exatamente pasteurizadas. Na realidade, para cumprir sua função de “fábulas moralizantes”, eles precisavam balizar o bem e o mal, sendo que suas personagens não eram de maneira alguma intocáveis. Paixão, medo e morte são constantes nas histórias. Muito mais do que príncipes encantados e sapatinhos de cristal. E este “O Conto dos Contos”, baseado em algumas histórias do fabulista italiano do século 17, Giambattista Basile, e de seu livro “Il Pentamerone”, segue à risca a máxima de reforçar a mensagem, a qualquer custo.

São três histórias que correm paralelas, sem muito se entrelaçarem. Numa delas, o Rei (John C. Reilly) e a Rainha (Salma Hayek) do reino de Longtrellis são infelizes por não conseguirem conceber um filho. Um mago andarilho lhes dá uma esperança, com uma estranha simpatia: a Rainha deve comer o coração de um monstro marinho, cozido por uma virgem. Mas faz uma ressalva: vida e morte vivem em equilíbrio.

Na segunda história, o priápico Rei de Strongcliff (Vincent Cassel) escuta ao longe uma bela voz de mulher e imediatamente tenta conhecê-la. Tomando-a por uma bela jovem, parte para a corte à donzela. Mas, na realidade, trata-se de Dora (Hayley Carmichael), idosa que vive reclusa com sua irmã, a também idosa Imma (Shirley Henderson). Incorrendo em erro, o Rei tenta cortejá-la.

E, na terceira história, o Rei de Highhills (Toby Jones), viúvo, vive em função da adorada filha, a princesa Violet (Bebe Cave), até que sua atenção se desvia completamente para uma pulga (!) que, cuidada “carinhosamente” pelo rei, começa a se desenvolver assombrosamente.

Algumas incongruências, da escalação de elenco à caracterização dos personagens, acabam por criar ruídos quase intransponíveis no filme. Apesar de sua beleza, ainda presente, Salma Hayek fica a dever no quesito interpretação, com sua expressão facial inalterada em praticamente todas as cenas. Sem falar no sotaque. Aliás, esta primeira produção em idioma inglês do italiano Garrone, peca pela escalação internacional do elenco, com italianos e franceses atuando quase foneticamente, enquanto que os nativos da língua inglesa se destacam (até involuntariamente).

Quanto à caracterização, o maior incômodo fica por conta das irmãs idosas, interpretadas por duas atrizes ainda jovens com pesada maquiagem. Estranho, porque as atrizes em momento algum aparecem com sua real idade. Porque então não escalar duas atrizes com as idades adequadas? (SPOILER) A única delas que aparece rejuvenescida é representada por outra atriz (Stacy Martin), mais jovem ainda, neste momento.

Por outro lado, a fotografia de Peter Suschitzky, a direção de arte de Gianpaolo Rifino, os cenários de Alessia Anfuso e os figurinos de Massimo Cantini Parrini, associadas às belíssimas locações italianas (que incluem quatro castelos deslumbrantes) transformam o filme numa experiência visual única. E a trilha sonora do prolífico Alexandre Desplat (mais de 160 créditos e um Oscar no currículo), adequadíssima como sempre. Não perca!



UM CONTO DE FADAS BELO E PERTURBADOR

por Pablo S Bazarello
para CinePop

De vez em quando, a sétima arte nos apresenta obras cujo estilo se aproxima muito de determinados cineastas, e juramos terem sido confeccionadas por tais. Em parte consideradas homenagens, muitas vezes diretores de prestígio “imitam” um visual ou narrativa que foi construído ao longo da carreira de outro companheiro de profissão. Assim, temos Woody Allen se vestindo de Alfred Hitchcock em Match Point – Ponto Final (2005), JJ Abrams homenageando o ídolo Steven Spielberg em Super 8 (2011) e David O. Russell dando uma de Scorsese em Trapaça (2013), por exemplo.

Em O Conto dos Contos é a vez do italiano Matteo Garrone (Gomorra e Reality – A Grande Ilusão) realizar sua melhor impressão do mexicano Guillermo del Toro, conhecido por seus contos de fada macabros e criaturas mil. Na trama, baseada no livro de Giambattista Basile e coescrita pelo próprio Garrone, o cineasta apresenta três histórias, sobre três reinos distintos e seus monarcas, que se entrecruzam ao longo. Neste conto de fadas subversivo, e mais próximo de como eram originalmente tais histórias, o italiano capricha no desconforto, na violência e no grotesco, ainda introduzindo muito conteúdo nas entrelinhas.

A primeira subtrama apresenta a mexicana Salma Hayek como a rainha infeliz de John C. Reilly, frustrada por não conseguir dar a luz a um herdeiro. Sua vida já não tem mais sentido. Como última solução, um misterioso homem pode trazer a tão sonhada resposta. Para isso, a regente só precisaria… comer o coração de um monstro marítimo! Então, seu bravo companheiro (Reilly) parte para trazer a especiaria a ser devorada pela futura matriarca – numa das melhores cenas do filme (a estética da coisa funciona por si só). O plano dá certo, porém, a virgem que cozinhou o “prato” também fica grávida de forma simultânea, parindo um gêmeo albino do príncipe em outro ventre. O elo entre os dois não será visto com bons olhos pela rainha.

Na segunda história, o francês Vincent Cassel dá continuidade à sua persona e fama sedutora no papel de um Rei mulherengo. O sujeito chegado a orgias está em busca de uma nova beldade a quem possa admirar. Após o vislumbre de uma camponesa, com a voz mais doce que seus ouvidos já escutaram, o supremo acredita ter encontrado a futura rainha. No entanto, sua nova pretendente está longe de ser sinônimo de beleza – isto é, até encontrar uma bruxa e ser transformada nas formas de Stacy Martin (Ninfomaníaca – Volume 1).

No terceiro ato, Toby Jones é o rei viúvo precisando criar a filha, a princesa vivida pela atriz Bebe Cave (a personagem feminina mais forte do filme). Ao encontrar uma pulga e começar a alimentá-la, o rei se depara com uma criatura crescente, chegando ao tamanho de um bezerro. Após sua morte por asfixia, o couro retirado do “pulgão” irá determinar o pretendente adequado para a princesa. Numa perturbadora reviravolta, a jovem termina prometida para um candidato, digamos, bem longe de seus ideais.


O Conto dos Contos é belíssimo. Seu visual é comparável a pinturas em movimento. Sua parte técnica e tudo o que envolve a direção de arte, figurinos e a fotografia do veterano Peter Suschitzky (The Rocky Horror Picture Show, O Império Contra-Ataca e Senhores do Crime) são dignos de indicações ao Oscar. As atuações comprometidas do elenco também são destaque. Seus contos deturpados servem de analogia para a moral e os costumes sociais, surpreendendo pela relevância e atualidade.



O CONTO DOS CONTOS
(Il Racconto Dei Racconti, 2015, 133 minutos)

Direção
Matteo Garrone

Roteiro
Massimo Gaudioso
Edoardo Albinati
Ugo Chiti
Matteo Garrone

baseado no livro de
Giambattista Basile

Elenco
Salma Hayek
Vincent Cassel
Toby Jones
John C. Reilly
Shirley Henderson
Hayley Carmichael
Bebe Cave
Stacy Martin
Christian Lees
Jonah Lees
Laura Pizzirani
Kathryn Hunter


Em cartaz no Cinespaço Miramar Shopping
com sessões às 18h e 20h20


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