Monday, May 30, 2016

A RESSURREIÇÃO DO COLUNISTA SOCIAL NATANIEL JEBÃO, VULGO FAUSTO WOLFF

publicado originalmente em O PASQUIM em data incerta


Eu, o grande Jebão, descendente de nobres alienígenas, imperadores, reis, príncipes e papas, jamais me preocupei muito com as questões espirituais. Uma vez que sou imortal, necessito apenas de dinheiro, mulheres e um alfaiate inglês. Tenho-os. Eventualmente, porém, comunico-me com o Além através do computador. Outra noite - depois de realizar com admirável sucesso a posição do coração da magnólia negra sobre a virgem neve - liguei o computador e alva ainda estava a tela quando por ela (viram como rimou?) passou um inseto mínimo, a décima parte de uma formiga.

Preparei-me para esmagá-lo quando uma voz tonitruante soou aos meus sensíveis ouvidos: ''Pense no que vais fazer, Jebão, pois sou Deus''. Para resumir uma longa e instrutiva conversa, direi apenas que ele me explicou tudo. E o tudo, como o nada - e confesso que esta parte não entendi direito, pois as esposas me chamavam para ver o último capítulo da novela Os ricos também broxam - é o ritual, o espetáculo. Houve uma época em que o show era o show e a realidade, a realidade. Hoje, apenas os eleitos, como Berzoini, conseguem distinguir o que é real do que é ficção. Os meios de comunicação usam o ritual para seu jornalismo e os ritualistas usam o jornalismo para o ritual. Por isso precisamos estar sempre atentos: a pedra pode ser nuvem e a nuvem pode ser o que bem quiser, uma vez que toma todas as formas.

Neste momento o mundo real tornou-se tão ficcional que a ficção decidiu vingar-se da realidade. A ficção pode matar a fome e o peixe pode estar podre. O Negro Preto (demorei a entender que ele se referia a Schwarzenegger) bem como a Rainha das Flores (esta foi fácil, referia-se à governadora Rosinha) são apenas alguns sinais que precisam ser decifrados. Depois do Negro Preto virá a Lassie (que em verdade é macho) e depois da Rainha das Flores virá o Baiuno Fresco, que ninguém sabe quem é. Quando a realidade houver se transformado em ficção e a ficção em realidade, Heráclito Fortes levantará um exército famélico no Piauí e invadirá a Venezuela. As autoridades venezuelanas darão de comer aos piauienses e Heráclito será contratado por um circo e fará sucesso no papel de Chico Banha.

Ele (e vocês sabem a quem me refiro) apontou com uma das suas milhares de patinhas para o imenso telão do tálamo, onde as minhas esposas se deliciavam com o último capítulo da novela, e desapareceu num canto da tela do computador antes que eu pudesse lhe perguntar sobre a quadratura do círculo, os limites do universo e o colossal universo dos limites. A resposta só poderia estar no telão e estava. No oitavo mês, Rachel descobriu que estava grávida de Fred, a doméstica. Júlio e Cláudio casaram no civil discretamente, mas no religioso, na boate do Taj Mahal. Arlindo descobriu que Salete é sua filha e mãe do dr. Valcour. Albertinho Limonta será governador da Bahia e descobrirão um poema de João Cabral de Melo Neto no qual ele confessa que a reforma agrária não passa de uma licença poética de sua autoria.

Abricós querem direito legal de casar com breubas

Os eternos descontentes aproveitam-se da falta de transparência da Transparência Internacional para atacar o rei Çilva I. Dizem eles que o monarca, ao contrário do que declarou em campanha, não acabou com a corrupção. Ora, quem quer que tenha um contato minimamente sexual com a arte da política sabe que ela é elástica como hímen barbarizado. O rei disse que acabaria com a corrupção antiga mas não falou da nova. Se falasse, não elegeria. Já o Vingador Careca não podia dizer que acabaria com a antiga porque era a dele. Por baixo do pano, o operário foi obrigado a deixar a nova corrupção correr solto para que os que não conseguiram roubar durante os oito anos do Mulatinho conseguissem pelo menos comprar um apartamentinho em Paris para mostrar aos netos. Isso se chama realpolitik, seus mongróvios!

Carrancas de São Francisco sorriem para bispo

Se não estivessem fazendo meia com os bombeiros nos intervalos de um ato para outro, os atores do teatro brasileiro já teriam copiado os políticos e ninguém os suplantaria. Nem Olivier em Lear, nem Gassman em Orestes. Esqueçam Stanislavski e consultem Duda Mendonça; esqueçam-se do Método e lembrem-se do Palanque. O que dói é que os políticos, esses grandes terpsicoristas, não podem nem receber os aplausos da platéia por suas atuações. Papéis decorados, lágrimas nos olhos, os ministros putrefatamente ricos, mas ainda assim mais preocupados com a polícia, já não explicam por que devemos entregar o Brasil à Alca. Enquanto isso, o rei Çilva I evita José Dirceu, que se transformou num homem-bomba prenhe de ameaças veladas. A vida é um palco cheio de som e fúria, que não significam nada para quem tem três Mercedes na garagem. Graças às informações de Deus, posso gritar, pois a acústica é excelente: ''Tudo pelo Teatro Social''.

Escravos de Jó não dão mais caxangá

Ariel Sharon jogava biriba sábado último com seu neto, o Jacozinho. - Pô, vô, este jogo está chato - disse o traquinas. O bom Sharon perguntou: - E o que sugere o Jacozinho para acabar com este tédio sabatinal? - Vamos bombardear terroristas. - Mas hoje, num sábado, dia de descanso? - Bombardear terrorista não é trabalho, é diversão. - Mas onde? Eles estão por toda a parte. - Bota o mapa do Oriente Médio no meio da mesa, vovô. O bom vovozinho fez o que lhe pediu o neto, que começou a contar batendo com o dedinho indicador no mapa: - Uni, du, ni, tê, um sorvete colorê, o escolhido foi você. - Líbano, de novo? - pergunta Sharon. E o menino: - Bem, a gente pode recomeçar. - Não, senhor. Jogo é jogo. Adoro este espírito esportivo que, como se sabe, nunca foi o forte de Hitler.

Mijões de rua querem proteção contra voyeurs

Ninguém pode negar que o moreno povo do torrão tem sorte. Ao contrário dos americanos e russos, dos franceses e ingleses, dos japoneses e coreanos, ele aprende na paz o que os outros sofrem na guerra. Alguns singelos exemplos: a tarifa de água e esgoto aumentou 22%, mas em compensação as contas telefônicas aumentaram apenas 2,5%, depois do aumento de 17%. É verdade que temos de pagar 20% na gasolina, o que fez com que tudo aumentasse o quanto quisesse, pois isso aqui ainda é uma democracia privatizada graças a Deus, privatizada também pelos bispos ladrões que nunca ouviram falar no São Francisco, o rio casamenteiro. Apesar disso, a inflação inexiste.

JEBARBOSAS

Alemãs de Hamburgo abriram uma creche onde deixam os maridos do meio dia às seis da tarde, enquanto elas se divertem nos rendez-vous locais.

* Apesar disso, o número de cornos teutônicos continua estável.

* Lágrimas nos olhos, Çilva I implorou aos banqueiros que emprestassem dinheiro aos pobres, jurando pela honestidade deles. Os banqueiros não se comoveram.

* O Fluminense perdeu de 6 a 1 para o Paraná e depois foi até Caxias do Sul e ganhou de 4 a 3 do Juventude. Estranho, muito estranho.

* Vote sim ou vote não ao desarmamento. Não importa o resultado, o número de armas dobrará.

* O Brasil tem duas leis não escritas que não podem ser quebradas: "Por baixo do pano" e "Pacto de silêncio", este último inaugurado pelo ministro Nelson Jobim. Elas podem ser invocadas por qualquer parlamentar apanhado com a bunda de fora.

* O Vaticano sempre teve um papa para aparecer – o oficial – e um papa para mandar – o Papa Negro, que sempre foi branco.

* Por enquanto só se sabe que o Papa Negro do alemão é cambojano.

* O desenhista do belo filme A Fuga das Galinhas inspirou-se no sorriso das senhoras que alegram a crônica social brasileira e que – desconhece-se o motivo – são chamadas carinhosamente de peruas.

* Palavra de Jebão: o Congresso aprovará o casamento entre os senhores viados por larga margem se a votação for secreta.

* Muitos parlamentares alegres não querem tornar pública a sua alegria.

* Desmentida a notícia de que o decorador Cesar, o Maia, teria sido vítima da febre aftosa.

* A ONU declarou que a responsabilidade de acabar com a tortura no Brasil é do seu Sardinha, vendedor de pipoca em Aldeia Campista.

* Numa tentativa de agradar aos religiosos, os traficantes têm batizado a cocaína.


Nataniel Jebão é uma criação imortal
do jornalista gaúcho Fausto Wolff.
Nascido em Santo Angelo em 1940,
Wolff começou como repórter policial
no Diário de Porto Alegre.
Já no Rio, dava nó em pingo d'água
escrevendo diariamente 3 colunas
para 3 jornais diferentes.
Colaborador de O Pasquim desde o início,
Fausto decidiu virar romancista
em meados dos Anos 70
e cometeu alguns romances de sucesso como
O Acrobata Pede Desculpas e Cai,
Matem o Cantor e Chamem o Garçon
e O Dia Em Que Comeram O Ministro,
todos lançados pela Editora Codecri de O Pasquim.
Morreu em 5 de Dezembro de 2008 no Rio.


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