O crítico deve preferir a ordem cronológica, a única que põe a obra de um homem na sua verdadeira luz e nos dá as fases sucessivas de seu gênio. A ordem cronológica é como uma espécie de biografia do pensamento. É de Barbey D'aurevilly essa consideração e nele podemos aplicar. Este normando formado em direito tomou gosto pela literatura lendo Byron. Mais adiante, no período de formação acadêmica encontrou seu duradouro amor, Louise. Esse amor produziu ao longo de dezessete anos uma das mais belas correspondências. Amor que resulta num grande escândalo por ser adúltero. Barbey embarca para Paris e com sua bagagem levando sulcos profundos na alma. O primeiro passo literário é " Le Cachet D'onyx " e " As Diabólicas ". Provocante leva uma vida de Dândi por seus costumes e maneiras nos salões que frequentava. Doze anos após sua chegada acumula algumas publicações e em 1845 lança o livro " Brummel e o dandismo " (Quem não viu o filme "O Belo Brummel". veja.), batizado pela crítica como a estética do espanto. A partir de 1852 assume como jornalista, crítico literário que lhe levou produzir mais de mil e trezentos artigos, todos foram editados em 26 volumes. O que fascina na literatura de Barbey é o dogma do inferno. Um inferno visto com olhos que dá descrição muito vigorosa, o comportamento manipulador dos personagens vive em todos nós e vemos vivos na narrativa de uma das seis
histórias escabrosas do livro As diabólicas, do qual faz parte “A felicidade no crime”
Sai do roteiro após "As Diabólicas" do Barbey, me senti precisando de um copo d'água. Minha água foi o livro do Paulo Perdigão " No Ar PRK-30 " sugerido pelo amigo Manuel Marcelino. diga se muito divertido para quem ouviu rádio, porém pelo habito de frequentar o quarteirão francês " Dominique " de Eugéne Fromentin me chamou de volta para onde gosto de estar. La Rochelle é o berço do autor, mas o palco do livro é Saint Maurice onde passava suas férias. É inegável o sucesso de Flomentin como pintor com seus quadros representando a natureza e a vida. Um amor da juventude por Jenny Chessé e sua relação com Jenny Beraud rompida pela morte de Beraud são cicatrizes transferidas para as letras. A primeira obra de literatura foi " O Salão " em 1845, editado pela difel, minha edição está semi destruída, confesso não ter gostado do livro. Dois anos depois em 1847 pinta seu primeiro quadro. Pinturas sempre, literatura ocasionalmente e seus registros literários são na maior parte reflexos da pintura, mas em " Dominique " Flomentin transpõe seu romance com Jenny Chessé embora as chaves do romance não sejam muito claras. A espinha dorsal é acompanhar Dominique assistindo sua vida como um espetáculo dirigido por outros, suas idealizações. O que me encanta no livro é a descrição, tais como luzes embranquecidas, os olhos de Madelaine, cílios que escondem e que nunca deixam ver um ponto brilhante, muito próprio de quem pinta e nos conduz para detalhes de sua pintura. As descrições do pintor escritos cunham frases como toques de delicado pincel. Nesse clima Flomentin transforma suas tintas em letras e nós leitores apreciando um livro que finda com silêncio sereno para afastar as tensões deixadas por Barbey.
E depois de conviver com Augustin e Julie, Olivier, os Tambles, Ormesson, ficou difícil me despedir. Despedida comovente de Dominique, mas pedi licença para vasculhar um ponto pouco pesquisado que pela escassez de publicações no Brasil e rasa na América espanhola, só é vencida com paciência em sites especializados em arte. Pois então, Eugéne Flomentin publicou um ano antes de sua morte um estudo crítico sobre arte após viajar pela Bélgica e Holanda. Nasceu em 1820 e morreu em 1875. Dessas viagens fez muitas anotações ordenadas no livro " Os Mestres ". Constrói a partir das anotações registros descozidos e complexamente desproporcionais, contudo seu foco é a técnica e é ai que ganhamos na leitura minuciosa da arte. Nos mostra a necessidade da limpidez para não nos desviar do absoluto. Flomentin foi em busca de definição de valor: A qualidade do claro e escuro, sombras contidas num tom. Traduz em páginas Rubens, Rusdael, Rembrandt e mais, pondera sobre obras de seu tempo. De Coubert aos impressionistas. Lida a última página de " Os Mestres " saio com a impressão de que Flomentin se desliga do romantismo, senti esse romantismo se esvaindo e ganhando influência do academicismo cuja a retórica assume alto grau de importância. É um autor relevante para quem gosta de literatura e pintura visto ter se expressado nestes dois caminhos.
CAFÉ E BOM DIA
Carlos Eduardo "Brizolinha" Motta
é poeta e proprietário
da banca de livros usados
mais charmosa da cidade de Santos,
situada à Rua Bahia sem número,
quase esquina com Mal. Deodoro,
ao lado do EMPÓRIO SAÚDE HOMEOFÓRMULA,
onde bebe vários cafés orgânicos por dia,
e da loja de equipamentos de áudio ORLANDO,
do amigo Orlando Valência.
No comments:
Post a Comment