Friday, March 10, 2017

CAFÉ & BOM DIA #53 (por Carlos Eduardo Brizolinha)



Em busca do tempo perdido é arte e teoria da arte ao mesmo tempo, uma prova de que o todo é bem mais do que a soma de suas partes, de que o estilo pode bem ser uma maneira de ver o mundo. Com a obra, Proust faz bem mais do que oferecer sua vida e suas histórias a nossos olhos; ele oferece seus “olhos” para que nós, o leitor, vejamos melhor o mundo lá fora e a alma aqui dentro. O livro é, assim, um instrumento para desvendar o mundo, uma ferramenta de conhecimento, de autoconhecimento das mais nobres e eficazes, sobretudo depois de o assunto ter sido banalizado tanto assim nos últimos tempos. Muitas das personagens de Proust são baseadas em figuras reais, que viveram na época em que o autor frequentava assiduamente os salões de Paris. Pouco antes de começar efetivamente os trabalhos na Recherche, Proust ainda participou da tradução de duas obras do crítico de arte, escritor e poeta inglês John Ruskin, A bíblia de Amiens, publicada na França em 1904, e Sésamo e flor-de-lis, publicada em 1906. O trabalho nas obras e o entusiasmo de Proust em relação ao autor inglês é decisivo no desenvolvimento de alguns conceitos artísticos trabalhados em Em busca do tempo perdido. Mas Proust estreou mesmo na literatura com Os prazeres e os dias, uma coletânea de narrativas e esboços em prosa também publicada a suas próprias expensas em 1896. Mas a obra que se aproxima mais de perto de Em busca do tempo perdido é o romance Jean Santeuil, vários dos elementos temáticos da obra-prima já se encontram reunidos em Jean Santeuil. Marcel Proust trabalhou quase vinte anos – e intensamente – em sua obra-prima. Com o ensaio biografico de Nackes é possível compartilhar o café-da-manhã (duas xícaras de café bem forte, da marca “Corcellet”, com leite quente, e dois croissants da Rue de la Pépinière), servido pela fiel Cèlèste em uma bandeja de prata ao lado de Marcel.



Impossível tecer comentários de valor entre os dois códigos, o literário e o cinematográfico, mas na tela Pascal Quignard, que trabalhou na adaptação cinematográfica de seu livro, constrói um espaço de cor, brilho e sombra, semelhante ao que se pode admirar na pintura de Georges de La Tour, sobre o qual ele escreve La nuit et le silence. Neste livro, ele revela que houve duas grandes candeias na nossa história e elas se encontram no tempo: as lições das trevas da música barroca, as candeias das telas de Georges de La Tour. Os ofícios das Trevas da Semana Santa constituíam um rito no qual se apagavam uma a uma, durante o canto, as letras hebraicas que formavam o nome de Deus e, uma a uma, graças ao sopro de uma criança vestida de vermelho, as velas que a representavam na obscuridade da agonia. Como leitores do livro e espectadores do filme, podemos notar que há uma singular relação entre a página branca e a tela brilhante de luz, pois entre as duas, em um espaço virtual, intervalar, o silêncio, a imagem e a música se tornam paradoxalmente possíveis, em um mesmo tempo, em uma outra lógica, em um outro compasso. Tal efeito só se revela possível por meio de uma dissimetria poética, da qual só podemos falar valendo-nos de uma retórica especulativa, da qual fala Pascal Quignard em seus ensaios e que, parece-me, sustenta a toda sua obra. Finalmente, escrever é escrever o perdido, o indizível e a impossibilidade de captar e recuperar as coisas do outrora, a tentativa de recuperar o primeiro grito, não só as coisas em sua novidade, mas o momento do antes, a palavra aquém da linguagem, as coisas que brotam e que são fonte da linguagem. Ou, em outras palavras: "a linguagem afetada pelo silêncio é o ninho. Como o visível afetado pela obscuridade é o sonho. Muita coisa de Quignard foi publicada no Brasil " O Homem Errante " foi roteirizado por ele e o livro ganhou o Goncourt, o filme passou batido talvez pela densidade. Ruth Salviano especialista em Pascal Quignard eleva a costura escrita e imagem nos conduzindo em direção a obra.




Leitura que gostaria, mas o grau de dificuldade para achar um só volume na ocasião foi muro que não consegui pular. Como venho citando autores desprezados, François Weyergans me chamou atenção e tentei seu mais citado livro " Le Pitre " cuja espinha dorsal é uma zoação sem piedade de seu tratamento psicanálitico escrito oito anos antes do filme que o ami Didier me indicou e é inédito no Brasil. Como usufruo da rede desde o tempo da discada fui buscar informações do autor e diretor. Mantenho meu desejo de ler " A demência do boxeador " e muito, muito mesmo " trois jour chez ma mere " A partir daí, Weyergans dedicou-se inteiramente a arte de escrever, passando noites inteiras trabalhando a partir de 23:00 até o meio dia. Autobiográfico e irônico, carimbo dado pelos críticos que li. No livroTrois jours chez ma mère que lhe concedeu o Prêmio Goncourt em 2005. ele satirizou suas próprias dificuldades na entrega de um manuscrito prometido no tempo. No processo ele cria uma estrutura do tipo "Boneca russa" (Weyergans) escreve como um escritor, Weyergraf, que encontra todos os tipos de distrações ou razões para evitar a escrita de um livro chamado Trois jours chez ma mère. Ele faz isso em grande parte ao inventar um autor chamado Graffenberg, que por sua vez, inventa outro autor, Weyerstein, que esboça uma possível estrutura — mas ele está ficando assaltado pelas humorísticas meditações sobre sua própria vida, amor (ou apenas encontros), família, filmes e vários entusiasmos e interesses. Não foi editado no Brasil. Ganhei neste domingo uma edição em castelhano, pois continuamos sem um editor de coragem.




Obrigado a revisar algumas estantes cujo as quais não são cotidianamente consultadas encontrei " A Amante de Brecht " de Jacques Pierre Amette. Na página de rosto alguns recortes. No primeiro é apontada a duvida do critico com relação ao livros (...) Duvido que será lembrado em um tempo de cem anos...(...) diz ainda que o autor transmite uma atmosfera sub Tchekoviana de Berlim oriental e nenhum dos equívocos de Brecht. No segundo recorte Neil Gordon do New York Times Book Review aponta Amette (traduzido pela minha mãe) frouxo nos seus objetivos. Francamente achei o livro de Amette convincente de esperança e decepção e uma poderosa evocação de um tempo que desapareceu. Daí fico com Ian Brunskill, Times Literary Supplement . O ponto de partida é 22 de outubro de 1948, Brecht e Helene Weigel chegando em Berlim quinze anos após o exílio. Uma fotografia da chegada do casal na zona soviética dá novela do Amette sua cena de abertura. Nasce sem esforço e elegantemente o que poderia ter sido uma releitura árida da história e ideias. É um livro de não pode ser tomado com a pretensão de loas ou ser acolhido por intelectuais, mesmo porque assim como tantos outros autores fizeram, Amette insere uma personagem ficcional com a missão de ligar a vida íntima ao ativismo de Brecht - Maria Eich, inspirada numa fotografia de uma atriz não identificada em um grupo entorno de Brecht durante os ensaios da peça " Mãe Coragem ". Poucos autores conseguem manter essa mescla com elegância. Há o que é sério tal como Yourcenar ou os que usam de liberalidades como Marice Druon, Jean Plaidy, Mary Renaut. Sempre foi uma literatura com espaço garantido cujo o mestre foi Alexandre Dumas com seus pesquisadores nos anais de France. Com Amette damos as mãos para vê-lo apontar as batalhas do formalismo e realismo que, na década de 1930, modernistas Brecht e Walter Benjamin, contra a ortodoxia severa de Georg Lukács. Muitos outros pontos do período são abordados. Editado no Brasil.



...você usa longos corredores para treinar grand jeté.

...você tem mais sapatilhas de ponta do que sapatos normais.

...alguns te confundem com um pedaço de borracha.

...em vez de dedos você tem bolhas nos pés.

...você sobe na meia ponta quando conversa com seus amigos.

...você se senta na abertura confortavelmente.

...a dança é a vida, o resto é apenas um passatempo.

...piruetas e fouetté são as palavras principais de seu vocabulário.

...você conhece mais palavras em francês do que em inglês.

...vocês só consegue contar até oito.

...você ri quando alguém que não dança reclama que o pé esta doendo.

...assistir TV é a hora de se alongar.

...você promete nunca parar de dançar.

...você atravessa um corredor dançando, ao invés de andar.

...todos os seus amigos estão jantando enquanto você esta ensaiando.

...você faz pliés e tendus enquanto está na fila.

...você faz grand jete nos estacionamentos e quando desce a rua.

...você tem os músculos mais fortes do que os meninos do seu colégio.

...você usa breu em vez de sabão.

...antes de qualquer coisa você conta 5 ,6, 7 e 8.

...você escova os dentes treinando sustentamento devant, la second e derière.


MEU CAFÉ DANÇA NA XÍCARA
NA LUMINOSA MANHÃ

BOM DIA



Carlos Eduardo "Brizolinha" Motta
é poeta e proprietário
da banca de livros usados
mais charmosa da cidade de Santos,
situada à Rua Bahia sem número,
quase esquina com Mal. Deodoro,
ao lado do EMPÓRIO SAÚDE HOMEOFÓRMULA,
onde bebe vários cafés orgânicos por dia,
e da loja de equipamentos de áudio ORLANDO,
do amigo Orlando Valência.




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