Wednesday, February 10, 2016

BOFETADA DO PASSADO RESGATA HOJE A SENSUALIDADE PERIGOSA DE MODESTY BLAISE

por Chico Marques


Modesty Blaise foi a resposta feminina a James Bond nos Anos 60.

Criada e desenhada por Peter O'Donnell, sua tira foi publicada no jornal London Evening Standard por 40 anos e fez sucesso no mundo inteiro.

Aqui no Brasil, suas aventuras eram publicadas na página de quadrinhos do Jornal da Tarde.



O histórico de Modesty Blaise é muito curioso.

Sofria de amnésia desde a infância, e conseguiu fugir de um campo de refugiados em Kalyros, Grécia, no final da Segunda Guerra Mundial.

Vagou pelo Norte da África, Mediterrâneo e Oriente Médio no pós-guerra, cometendo pequenos crimes para conseguir sobreviver naquele ambiente hostil.

Já quase adulta, conheceu um refugiado húngaro chamado Lob, que a educou e lhe deu o nome Modesty -- ao qual ela adicionou o sobrenome Blaise, referente ao tutor do mago Merlin na lenda do Rei Arthur.




Modesty rapidamente ascende na hierarquia do submundo do crime, operando em Casinos.

Torna-se chefe de uma quadrilha em Tânger e cria uma organização chamada REDE.

É quando ela conheceu Willie Galvin, que pouco a pouco se torna seu braço direito.

Detalhe: nunca rolou nada entre eles além de um relacionamento estritamente platônico, pois ambos sempre souberam que um envolvimento sexual poderia arruinar o equilíbrio que existia entre eles -- se bem que a tensão sexual entre os dois sempre foi indisfarçável.



Aos trinta e poucos anos de idade, Modesty conclui que já havia acumulado dinheiro suficiente para se aposentar de sua vida de crimes na REDE, e decide ir morar na boa e velha Inglaterra.

Willie, naturalmente, a acompanha.

Lá, ela conhece Sir Gerald Tarrant, um alto oficial do Serviço Secreto Britânico, que conhece seu passado e, para não prendê-la, decide recrutá-la como Agente Secreta.

É a partir daí que começam as aventuras da espiã Modesty Blaise.

Como de hábito, Willie vem no pacote.



Em suas viagens, Modesty e Willie ajudam pessoas em situações de necessidade enquanto enfrentam bandidos excêntricos em lugares distantes -- muitos deles, sintomaticamente, amigos ou inimigos da época da REDE.

Os dois raramente matam alguém, apesar de terem licença para matar, pois são treinados em artes marciais e preferem fazer uso de um arsenal de armas não-letais.


Para Peter O'Donnell, o maior desafio de sua carreira foi tirar Modesty Blaise dos quadrinhos, onde era extremamente popular, e escrever um roteiro para um filme com ela.

O filme "Modesty Blaise" foi lançado em 1966, dirigido pelo talentosíssimo Joseph Losey e estrelado pela maravilhosa Monica Vitti.

Antes de escrever o roteiro, no entanto, O'Donnell optou por escrever um romance sobre Modesty Blaise, para em seguida adaptá-lo ao cinema.



Foi o primeiro de uma série de 30 livros estrelados por sua bela e insinuante heróina.

Quanto ao filme, infelizmente não obteve o sucesso de público esperado.

Por conta disso, não gerou uma sequência.



Só em 2002 Modesty Blaise retornou à tela grande através de Quentin Tarantino, fã incondicional da espiã, que adaptou um dos romances de O'Donnell para o cinema.

"Meu Nome É Modesty" teve pouca repercussão, mas agradou aos fãs das tiras e dos romances de Modesty Blaise -- além, é claro, dos fãs habituais de Tarantino.

Quem interpretou Modesty foi a bela novata Alexandra Staden, que lembra vagamente a saudosa Silvia Kristel.



Kingsley Amis, grande romancista inglês -- pai do também grande romancista Martin Amis -- foi talvez o primeiro escritor de prestígio a saudar as virtudes de Ian Fleming como escritor e dar respeitabilidade a James Bond 007 perante a intelectualidade britânica.

Vejam o bilhete carinhoso que Kingsley Amis enviou a Peter O'Donnell no início dos Anos 70:

"Eu só quero agradecer-lhe e felicitá-lo por escrever os livros de Modesty Blaise. Eles são infinitamente fascinantes. Eu os li pela segunda vez recentemente quando derrubado por uma gripe implacável, e tenho certeza que eles fizeram tanto quanto o médico me fez colocar em pé novamente."



Peter O'Donnell nasceu em Londres em 11 de abril de 1920.

Seu pai, Bernard, era um repórter policial.

Lutou pelo Exército Britânico durante a Segunda Guerra Mundial, servindo na França, na Pérsia, no Iraque, na Síria, no Líbano, no Egito, na Itália e na Grécia.

Suas experiências nesses lugares ele transferiu para Modesty em seu início de vida, o que forneceu à ela credibilidade, além de um estofo existencial sólido e robusto.

Foram nada menos que noventa e seis histórias em quadrinhos e trinta livros.

Morreu aos 90 anos de idade em 3 de Maio de 2010.



Nunca quis que outros escritores dessem continuidade a Modesty Blaise.

Por conta disso, optou por matar Modesty Blaise em seu último romance, "The Trap Cobra", passado quinze anos depois da maioria de suas aventuras.

Ela é dignosticada com um tumor cerebral inoperável, e então decide se sacrificar para salvar um trem cheio de inocentes de um grupo de terroristas.

Ela e Willie são mortos a tiros.

O'Donnell, no entanto, não teve coragem de repetir esse final violento quando adaptou a história para os quadrinhos.

Optou por uma morte alegórica para ela e Willie, num cenário de por do sol, depois de terem doado um tesouro para o Exército da Salvação.

Modesty diz para Willie:

"Sem vilões, nem vítimas, nem sangue, suor e lágrimas... vamos fazer uma pequena pausa, Willie querido, só você e eu."

E Willie, sempre galante, responde:

"Melhor assim, princesa, melhor assim."


No comments:

Post a Comment